terça-feira, 21 de dezembro de 2010

SANTA INQUISIÇÃO

O processo penal pode ser considerado um instrumento para efetivação do Direito Penal material, sendo, por isso, o meio de privar a liberdade do sujeito de Direito, ou seja, uma forma legitimada, pelo Estado e seu povo, de restringir um cidadão de um Direito Humano consagrado pelo nosso Texto Constitucional.


Para falarmos em privação de um direito humano, consagrado na Norma Maior por conquistas históricas, devemos nos atentar para que tal medida seja feita observando outros direitos de igual valor que tendem a proteger o ser humano como indivíduo, independentemente de ser ele um infrator penal ou não. Por isso o Direito Penal deve sempre ser mitigado de maneira mais ampla possível com os Direitos Fundamentais, o que a doutrina nomeia de Direito Penal Mínimo. Perspectiva essa estabelecida pela Constituição Federal.

Nessa concepção do Direito Penal e Processual Penal devemos sempre questionar os institutos aplicados pela sociedade, que muitas das vezes pretende penalizar uma classe marginalizada pela própria sistemática social. O processo em si, como dito por Franz Kafka em o processo, já é uma pena para a vida do sujeito por ele atingido.

Na mesma esteira de pensamentos, Cesare Beccaria em sua obra dos delitos e das penas, já defendia que, em um processo justo, as pessoas do acusador e do julgador devem ser necessariamente distintas. É o processo penal acusatório, princípio reconhecido pelo aforismo “ne procedat judex ex officio” (o Juiz não pode dar o início ao processo sem a provocação da parte). Ou seja, defende-se que o processo penal deve ter restrito o seu impulso às partes, tanto de defesa quanto de acusação, impedindo o órgão julgador de tomar iniciativa no curso processual, inclusive (senão principalmente) na denúncia. Não cabe aqui adentrar nas exceções desse princípio, mas genericamente pode-se afirmar que é possível admitir casos em favor do réu e para o perfeito andamento do processual, de forma mais imparcial possível ou que tende a garantir a efetividade de garantias fundamentais.

No Direito pátrio, o princípio aqui discutido de um processo acusatório é mitigado com o inquisitivo. Há em nosso ordenamento anomalias como o artigo 311 do CPP em que o juiz pode decretar prisão preventiva de oficio e o pior, o artigo 5º, II, do CPP que permite ao Juiz requisitar a abertura de inquérito policial. Não obstante ter a possibilidade de dar impulso inicial ao inquérito, esse mesmo procedimento de investigação, futuramente, se vir a ser objeto de ação judicial penal, tem a possibilidade de ser distribuído ao mesmo juiz que fez a requisição do Inquérito. Considerando que a maioria das comarcas em nosso país são pequenas, são grandes as chances disso ocorrer.

Nesse exemplo dado, para o leitor, na ótica de acusado, qual seria o sentimento de confiança, de um processo imparcial e justo? Seria realmente um juízo de garantias constitucionais, ou um meio de privar a liberdade de um cidadão que ganhou o desprestígio de um julgador?

Admitir o processo penal sem críticas, negando as mazelas por ele trazidas, é o mesmo que dizer sim para uma ofensa direta à direitos invioláveis. O Direito não pode retroceder aos tempos medievais em que o processo se resumia na figura de um único sujeito. Procedimentos como a inquisição são manchas em nossa história que devem ser apagadas. Os operadores do Direito devem buscar um Direito Penal justo e não justiceiro como vemos.
(texto feito por mim e publicado no "Acta Diurna")

sábado, 4 de dezembro de 2010

Servindo a Deus e ao Diabo

"Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro". Sim, eu estou a começar um texto com uma frase utilizada pela campanha da fraternidade[corrigido] 2010 realizada pela igreja católica. É necessário àquele que se diz dialético, e não fanático, assumir que um sujeito que, em regra, posiciona-se opostamente à suas idéias pode concluir premissas de grande sabedoria. Tenho de concordar com a idéia de ser impossível, em um modelo capital, vermos competitividade, exploração, mais-valia, relação empregador-empregado, mitigada positivamente com princípios cristão. Pois bem, não irei falar de Cristo por um texto, isto eu costumo fazer somente em debates pessoais, quero ir um pouco mais além (ou aquém?). Seria possível servir à democracia e ao dinheiro ao mesmo tempo?

Ultimamente tenho recebido várias críticas quando afirmo não acreditar na democracia, contudo, enquanto ela viger, ainda sim defendê-la-ei. Soa um tanto quanto ditador (e às vezes contraditório como disse Caroline outro dia). Mas não é, afinal, ainda não vi o que eu realmente acredito ser democracia, enquanto isto colocam uma máscara em um sistema - que de democrático nada tem, afim de legitimar um mecanismo sócio-econômico que já se mostrou pernicioso, principalmente com as últimas crises.

O preenchimento do que seja democrático necessita de discussão, contudo, penso que não há outra forma de compreensão de seu significado senão com a participação de todos envolvidos em debates realmente livres, onde as condições materiais sejam, pelo menos em seu mínimo existencial (aqui mais um problema de preenchimento semântico), de igualdade. Não me é racionalmente admissível propor uma democracia baseada na exploração da relação de trabalho, ainda que vigente uma Lei trabalhista, e ao mesmo tempo afirmar que o sistema que parte de princípio basilar a igualdade material. Sem mencionar milhares de outros exemplos, como a habitação, que consegui por mero interesse econômico realizar um mercado especulativo, onde há mais habitação vazia na capital mineira do que o número de desabitados, e ainda assim, estes são em grande número e tratados como marginais. Como discutir democracia em um âmbito deste?

Sim, serei considerado um comunistazinho que prega a favor de pessoas que não buscam o trabalho e a dignificação, e toda aquela historinha que se alguém consegue ascensão os outros também conseguem. Chego a rir, mas depois lembro que o assunto é sério. Esse discurso da classe média alta é perigoso, inclusive quanto a ela mesma, para não dizer muito maldoso e proposital. Ao vermos os mecanismos do mercado vigente, onde o Estado virou uma empresa, que deve reduzir gastos, aumentar lucros e ser regido por uma ordem empresarial, fica em minha cabeça, existe empresa democrática?

Nesse novo paradigma estatal, que dizem ser democrático, mas o é impulsionado por desejos econômicos, a possibilidade de um país ser o explorado macroeconomicamente, é muito maior do que ser o explorador, bem como as possibilidades da população ter sua exploração na micro-economia de seu país. Essa é a lógica de um sistema baseado em competição e “meritocracia” (há mérito na ausência de competitividade de fato, por exemplo, entre estudantes da rede privada contra rede pública ao aceso à universidades?). A escassez de recursos submete o Direito e demais estudos de formação do Estado, estão todos subjugados ao modelo econômico. Sem uma reestrutura do mesmo, discutir democracia e Direito não passa de discutirmos o sexo dos anjos. Volto aos meus queridos inimigos religiosos (mas não os deixo de amar): Vocês não podem servir à Democracia e ao dinheiro.



.... Fica aqui  mais uma reflexão minha, com um pouco de estudos, mas muito mais de sentimento que permeia minha alma cada vez que descubra mais as mazelas sociais... Fica o sonho pelo debate com quem aqui passa. Abraços fraternos

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Um toque de Sofia

Pois é! Sabe quando você não pára de pensar? putz, se vc sabe, meus pesames, temos algo em comum que sempre me incomodou e me dá tranquilidade existencial (ou não).
Considero uma boa virtude, naqueles que a vejo e também, em mim, o fato de me criticar o tempo inteiro.
Acabei de me ver formalista de mais, e assustado com isso. Afinal, para mim as revoluções devem ser absolutas, inclusive aos métodos!
Porque só escrever em artigos e normas? pffff tava quase me corrompendo, me desculpem amigos. Filosofia ultrapassa formas. O Direito ultrapassa até a filosofia, quem não enxerga a dor do próxima não será suficientemente sensível para entender os problemas hermeneuticos de uma quase ciência.

Pois é! Reflitam comigo o início do livro que realmente mudou minha vida e batizará uma possível filha:

O mundo de Sofia

Será a verdade cômoda?
Será a verdade incômoda?
Será a verdade filha da necessidade
e por isso mãe da realidade?
Será o homem uma criação de Deus
ou Deus uma criação da humanidade?
Criador ou criatura?
Tutor ou tutelado?
Talvez cego lesado
levado a crer no que precisa
para aceitar o que não pode ser mudado
Criador ou criatura?
Inocente ou culpado?
Talvez a verdade seja uma questão de ponto de vista
e a mentira um ser mutável
que igual à larva da borboleta com o tempo torna-se aceitável
Ficando a critério de cada um escolher a sua verdade,
A mais agradável.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Por uma Democracia pós-moralística

Nesse semestre eu tive uma professora fantástica! Ana Maria Coutinho! apaixonei ahhaha... tem foto dela no orkut para os curiosos. Pois então, nao foi pelo charme fantástico que ela tem, mas pela crítica, pelo posicionamento esquerdista que ela introduz aos calouros. Bem sensata, com uma paixão pela França, ela domina o assunto, e ao fim do semestre, ela pediu uma reflexão sobre DEMOCRACIA.

Não obstante o carinho por ela, é um tema que a muito me intriga. Teoria e prática, um dilema, uma dialética, uma problemática. Não é fácil se posicionar, ainda mais sem ser extremista. Mas é tarefa de um não covarde, e espero eu, chegar algum dia de uma teoria próxima dos meus ideais e com consistência a ser aplicada.... Deixa de EU's aqui, e vão pras idéias....


                           O estudo da democracia perpassa por muitas complexidades, das quais é impossível abordá-las com simplicidade e em poucas páginas, portanto não tenho a pretensão de solucionar conflitos como representatividade e participação direta. Contudo, é válido uma reflexão a cerca de uma democracia plural, onde não mais é possível uma ditadura da maioria, tampouco a vontade geral, mas uma construção racional da realidade a fim de abarcar as necessidades dessa sociedade multifacetada com total dignidade.

                          Para o que se propõe é necessário um rompimento de medos e dogmas. A respeito do temor de um totalitarismo despido de moral, como o governo alemão iniciado em 1937 e encerrado na segunda guerra mundial, contraposto com um Estado que propõe dogmas fundados em um moral digna, porém, de nada democrática, tendo em vista que as decisões do que é digno ou não ficariam nas mãos de poucos membros justiceiros, os aplicadores do Direito, mais especificamente, os magistrados.

                                           Em oposição aos dois tipos de pensamento, o que se faz necessário em mundo globalizado, onde a diferença é o marco, o reconhecimento, a redistribuição e o convencionalismo é uma tríade essencial para se pensar em democracia.

                                                Quando falamos em reconhecimento trazemos traços habermasianos e principalmente de Axel Honneth, onde o Ser Humano vive em uma busca constante em reconhecer a partir do outro, intersubjetivamente. Esse reconhecimento é dado em três esferas de relações, mas o mais importante, é que quando trata-se de relações sociais, o Direito é fundamental para a conquista e a busca do reconhecimento, sendo possível tal auge apenas com um ordenamento que garanta igualdade e respeito amplamente difundidos.

                              Quase que como uma seqüência lógica, podemos utilizar as idéias de Nancy Fraser, que trata da redistribuição. O motivo de avocar tal termo é uma crítica à Honneth, que crê ser possível uma conquista de Direitos unicamente com o desejo do sujeito em ser reconhecido pelo outro. Criticamos tal conclusão e propomos que a materialidade além de ser presente, na maioria da vezes, ultrapassa esse senso subjetivo de querer-se reconhecido. Entendemos ser necessário condições materiais que coloquem em pá de igualdade os atores sociais para podermos pensar em uma mudança, ou no mínimo, que estes entendam essa necessidade a ponto de romperem estas estruturas, e que na pior das hipóteses, a conquistem por meio da política.

                              Considerando a luta e a conquista gradual do reconhecimento e dos meios materiais (inclusive o Direito) atingida, entra agora uma nova questão, como comandar os rumos desta sociedade? Uma sociedade que permite a liberdade do individuo, que deve atender as necessidades dos não reconhecidos e ao mesmo tempo permitir um avanço econômico do capitalismo predatório. Há possibilidade dessa conciliação? Covardia acadêmica seria dizer simplesmente sim, mais covarde é dizer que não há propostas a serem apresentadas.

                                                   Para tanto, é preciso fazer uma desconstrução da moral como vista hoje, de maneira ainda Kantiana, substantiva, e por mais que algumas vezes, construtiva e pragmática, ainda é dotada de dogmas, que como descrito por Nietzsche, só servem para afirmar condutas reiteradas de uma classe dominante da sociedade. Rompendo essa idéia, bons argumentos são trazidos por Kohlberg, ao tratar de uma moral pós-convencional, onde algumas poucas pessoas atingiriam no nível 3, estágio6, um agir dotado de ética, uma universalização crítica, que visa em si um fim e não um meio. Onde o certo e o errado, tratado a tanto tempo pela filosofia, é encontrado com a empatia. Nesse momento de se colocar no lugar do outro, de construir uma normatização, no caso para garantir um Estado igualitário, possível para todos e digno, os sujeitos visariam unicamente o bem estar de todos. Contudo é possível ultrapassar tal autor, identificando motivos de não ocorrência desse estágio moral na conduta dos seres. Uma análise material da sociedade nos permite perceber que a ausência de crítica no agir é ligado a uma alienação exercida sobre a maioria, onde vários poderemos os oprimem, mas, evidentemente, aquele ligado a sobrevivência material prevalece. Quase de maneira cíclica caímos agora na necessidade de reconhecimento e redistribuição novamente, e por isso não há como desassociar um ponto do outro. Aqui chegamos a uma conclusão pessimista outrora percebida pela primeira escola de Frankfurt, que nesse capitalismo onde a necessidade de engrandecer as diferenças é a base do sistema é impossível conseguirmos equilibrar as balanças dos poderes sociais, dessa forma não há como pensar em uma moral pós-convencional, um espaço público que as pessoas possam exercer o discurso, impossibilitando qualquer esboço de democracia.

                                                 Ficamos assim, em um utopia, mas qual será ela? Introduzir um convencionalismo no capitalismo, com o reconhecimento e a redistribuição? Ou, sonhar com um sistema onde as diferenças e explorações não sejam a base? Cabe aos que possuem a possibilidade de pensar, como nós acadêmicos, a crítica. Cabe aos atores da sociedade de maneira geral, lutarem, mendigarem, contra uma tensão existente há milênios, enquanto isto, a democracia continua sendo um sonho, onde migalhas nos são dadas, e a opressão vem pintada em alegorias cabe vez mais belas.

terça-feira, 29 de junho de 2010

O indivíduo frente a ética nacional

Bem, muito tempo sem escrever aqui. Diante algumas coisas que vi por aí, um papo com alguns colegas, decidi rever meu antigo plano, e jogar minhas idéias aqui, para ver se dá polêmica, ou no mínimo algumas concordâncias.
Vou recomeçar por um tema maneiro que tive de dissertar no ENEM de 2009, que por coincidência já mudou minha vida 2 vezes.
O tema gira em torno de "O indivíduo frente à ética nacional". O tema foi abordado inclusive pela perspectiva do "eles são todos corruptos", bem como proposto com os conceitos de espaço comum. por isso escrevi, na integra, o seguinte texto...


Os altos índices de corrupção presenciados no Brasil acarretam no grande descrédito por meio da população acerca da existência de ética no cenário político. Com isso é perceptível a ausência de participação popular nesse meio, seguidas das justificativas muito presente em várias camadas sociais, que se resumem em um velho brocardo: “é tudo ladrão”.
Não obstante a imagem politiqueira que é passada dos agentes políticos brasileiros, percebe-se que os baixos níveis de educação e conscientização da população são causa e manutenção da falta de ética. Esses fatores, como ausência de participação e de consciência política, resultaram em um processo histórico onde as mudanças paradigmáticas do Estado brasileiro sempre ocorressem a partir dos líderes para o restante dos cidadãos, os resultados foram reformas sem legitimidade.
Com base nessa síntese levantada, entre a falta de ética e a inércia da população brasileira diante o problema, a solução pode ser buscada nos pensadores que esforçam em teorizar as problemáticas da sociedade. Axel Honneth aponta que o sentimento de restrições de direitos e a vexação, resultantes dessa crise ética acarretam em pequenas e grandes revoluções sociais, assim, cada indivíduo seria mais participativo nas decisões da sociedade e inserido nos discursos democráticos. Nesse cenário, fundamenta Habermas ser possível dizer que, com educação e participação dos envolvidos nos discursos políticos, a democracia se concretizará, impossibilitando aberrações como a corrupção nos moldes e quantidade dos dias de hoje.
A ética, portanto, só é possível com os ideais da moral pós-convencional e filtradas pelos Direitos Humanos, sendo imprescindível a participação absoluta de todos.